domingo, 24 de janeiro de 2010

Just an Old Sweet Song

Ontem eu visitei as cataratas do Niágara e sabe o que mais me deixou louco por lá?
Eu estava em frente a uma loja quando de repente eu ouço "Georgia on My Mind". E como aquilo me fez feliz. Fiquei andando de um lado pro outro, sempre perto da loja pra não perder nem um segundinho da canção. Devia estar parecendo uma barata tonta embrulhada num colchão - sabe como é, tenho que usar muitas roupas por aqui.
Mas antes que a canção acabasse, eu tive que partir. Era a hora de voltar pra casa.
E conforme eu caminhava, o volume da música diminuía e o meu coração se apertava.
Eu me senti em um final de filme. Um filme em preto e branco. Cinema mudo. Pra exigir mais da nossa imaginação.
Mas quer saber, podem subir os créditos.
O final foi feliz.




quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Decifrando Espelhos

"No dia em que fui mais feliz
Eu vi um avião
Se espelhar no seu olhar até sumir
De lá pra cá não sei
Caminho ao longo do canal
Faço longas cartas pra ninguém"

Porque esta música me veio à cabeça e eu não sei a razão. Se é que existe. Talvez porque eu sinta falta da bússola que eu nunca tive. E me invade também a ideia de que "bússola" é uma palavra horrível. E tudo é uma rede de memórias, porque acabo de me lembrar de "Vidas Secas" e de como um dos personagens do livro se maravilhava com uma palavra que fazia referência ao demônio - não me recordo exatamente qual porque o demônio tem muitos nomes - e o menino pensava como uma palavra tão bonita podia significar uma coisa tão feia.
Vidas Secas foi o primeiro livro de impacto que eu li. Eu posso me lembrar exatamente do dia em que eu o comprei. Havia uma exposição no shopping com o objetivo de incentivar a leitura e, como eu estava invadindo este universo, fui conferir a tal exposição com os meus pais. Eu me lembro de ter me aproximado dos livros e não conhecê-los. Posso me lembrar da voz do meu pai sugerindo Graciliano, posso me lembrar de um casal dizendo que eu tinha bom gosto ao escolher aquele livro, posso me lembrar da minha mãe dizendo que ninguém no nosso país podia se tornar um leitor - não com os livros por aquele preço. Porque eles estavam realmente caros.
Eu estava na oitava série e precisei de três dias para concluir a leitura. Lembro que levei o livro pra escola e uma amiga falou que até cego conseguia lê-lo - a fonte do texto era muito grande. Posso me lembrar que eu não entendi todas as passagens. Acho que até hoje não as decifraria.
Mas a razão disto tudo talvez seja porque eu estou com vontade de falar sobre uma vitória. Uma barreira que a gente ultrapassa. Uma atitude que defina o antes e o depois. Posso reconstruir a minha própria imagem naquela época, no início da adolescência e sentir um amor tremendo. Mas não por mim, nem por Graciliano. Nem mesmo por meus pais ou por aquele casal. Não é um amor direcionado e dedicado a alguém. É um amor pela vida. Por eu existir, pela oportunidade de manter o coração batendo, por eu não ter desistido.
E ontem mesmo meus amigos estavam falando que o número de suicídios aumenta no inverno e que a maior contradição é tirar a própria vida - se pra viver exige coragem, pra morrer então nem se fala.
E eu penso que eu quis morrer em alguns momentos. Se dependesse apenas de um controle remoto pra desligar tudo, eu teria apertado o botão. E eu juro que não tenho tendências suicídas nem desconheço o meu valor. Eu só estou sendo sincero da minha maneira. Existe uma boa razão pra ser tão difícil acabar com a própria vida.
É porque ela vale a pena.

domingo, 17 de janeiro de 2010

A primeira despedida

Hoje uma amiga voltou para o Brasil. Uma pessoa que se tornou bem especial em um curto intervalo de tempo. Assim como deveria ser, na verdade.
Esta experiência de ver gente legal indo e vindo também é bastante... foda. E foda pode significar muita coisa. Mas pelo contexto você pode sentir de que maneira a palavra se encaixa melhor.
É foda escrever sobre algo que você realmente acha foda. Porque existe o risco de não parecer tão foda quanto é.
Ter que se despedir de alguém é foda em qualquer idioma. Em qualquer lugar.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

A sensação do novo ou Enquanto houver esperança

Só pra começar, devo dizer:

sinto falta de tudo.

Hoje faz uma semana que eu cheguei em Toronto e é impressionante como a saudade está imensa, apesar do pouco tempo far from home. Acho que é porque eu estou longe de verdade desta vez e também por causa da correria das festas de fim de ano e tudo aquilo que elas envolvem.

A experiência de passar um tempo fora do Brasil está sendo válida. Primeiro de tudo, pela neve. Pelo que percebi, os nativos a odeiam. Eles bem que podiam transportá-la pro Brasil. Mas o fato é que ela torna tudo mais charmoso, ao meu ver. E eu, quando saio de casa atrasado e loucamente desarrumado para ir à aula naquele frio tremendo, penso comigo: eu não estou combinando com este lugar tão bonito. A gente tenta alinhar a roupa, ajeitar o cabelo, mas não tem jeito.

O que mais me chamou a atenção foi o fato de que, quando se está longe de tudo, andando sem direção e sem compromisso, "conhecer" vira sinônimo de se apaixonar. Não só por prédios ou lagos. Mas por pessoas também. Acho tão amável quando alguém vem conversar comigo. Hoje mesmo eu estava andando pelas ruas e na hora de voltar para casa eu decidi entrar em uma estação de metrô diferente da usual e, como já era de se esperar, eu não sabia se pegava o trem da esquerda ou o direita. Abri o meu guia e antes mesmo que eu pudesse conferir a direção apareceu uma senhora e me perguntou se eu precisava de ajuda. Acontece que eu me desespero um pouco pra falar quando eu sei que, se a tecla SAP falhar, eu não tenho ao que recorrer. Mas no final das contas a gente se entendeu, agradeci fervorosamente, como um bom brasileiro, e consegui chegar em casa.
E foi no metrô que eu arrumei um exemplar de jornal com uma matéria muito bonita sobre Miep Gies. Não sabe quem é? Eu também não sabia. De forma resumida, Gies foi uma das pessoas não-judias que se dispuseram a esconder Anne Frank e sua família dos nazistas. Quando Anne foi capturada, transportada e morta nos campos de concentração, Gies manteve o diário de Frank preservado. Quando o pai de Anne, único sobrevivente da família, retornou a Amsterdã, Gies entregou-lhe o diário, tornando possível a sua publicação para mais de 30 milhões de pessoas em 67 idiomas.
Com uma tradução rápida, segue o trecho da matéria que eu achei mais bonito:
"Mesmo passando a vida sendo testemunha da coragem e humanidade de Anne Frank, Gies subestima a sua própria coragem. "Eu não sou uma heroína", diz ela muitas vezes. Ela estremece todas as vezes em que as pessoas a veem desta maneira, fazendo com que todos duvidem da sua própria capacidade de fazer o mesmo. E ela diz que fez isso simplesmente porque pareceu necessário na época.
Por boa parte da minha vida eu pensei o que eu consideraria necessário na mesma situação. O que me preocupa é o fato de que, como milhões de pessoas, eu apenas abaixaria a minha cabeça, ou pior, escreveria uma coluna pró-Nazista com bastante entusiasmo. É muito mais fácil ser covarde.
Mas eu gosto de pensar que, se uma frágil mulher, uma simples secretária, foi capaz de permanecer gigante e corajosa diante do inferno, então eu também sou capaz. E quanto a você? Enquanto nós pudermos lembrar de Miep Gies e sua formidável história, existirá esperança para todos nós.
Miep Gies faleceu nesta Segunda, pela noite. Ela foi minha heroína."